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Painel hipnótico para pombos


Outro dia, eu estava caminhando pelas ruas de São Paulo, rumo à consulta semanal com a dentista, quando cruzei pela Paróquia Nossa Senhora da Consolação, na Praça Roosevelt. Eu ainda não tinha reparado na igreja. Gosto de olhar as igrejas. Então reparei um pouco mais enquanto caminhava e logo notei um painel colorido sobre a porta de entrada.


Era uma espécie de placa de tiro ao alvo, mas mais colorida, cada círculo com uma cor diferente. Achei inusitado aquilo estar sobre a porta da igreja, e quis saber do que se tratava. De longe, pude ver que tinha um letreiro sobre a placa. Com um pouco de esforço, li o que estava escrito: “Painel hipnótico para pombos”.


Achei graça. Que placa estranha! A princípio, pensei que fosse uma ação da igreja, um movimento voltado para atrair mais devotos. Mas aquilo não fazia sentido, não era o perfil do estabelecimento, fazer gracinhas. Caminhei até a clínica pensando na placa, e quando cheguei à recepção, saquei meu celular e pesquisei. É verdade! Aquele painel era mesmo hipnótico para pombos.


Mas como? E por que hipnotizar os coitados dos pombos?


“Para que eles não entrassem na igreja”, pesquisei mais na internet e achei um site que explicava sobre o painel da Roosevelt. Havia uma infestação de pombos na praça da igreja. Durante as missas, eles entravam e cagavam nos cristãos, espalhando sujeira e doenças. Uma invasão tão grande, que nem as orações deram jeito, imaginei.


Eu quis saber como funcionava o painel, e li que as cores e o modo circular da placa deixavam os pombos nauseados, causando até ânsias de vômito. Parei por aí. Achei triste. Sou contra maltratar animais. Que crueldade com os pombos! Principalmente, na porta de uma igreja, um lugar puro.


Eu sei que nem todos os animais são bem-vindos em todos os ambientes. Mas têm outros jeitos de afastar os pombos. Por exemplo: fechem as portas, pombos não sabem abrir portas; usem redinhas, como as dos apartamentos para proteger crianças e gatos. Agora a imagem dos pombos passando mal não sai da minha cabeça.


Fiquei matutando mais sobre o painel. E se existisse uma placa para pessoas ruins? Um painel hipnótico para humanos? Hm... De repente, fiquei cruel também.


Passei uma semana querendo escrever esta crônica, mas sempre que começava, me dava náusea. “Será que sou um pombo?”. Então fui pesquisar mais antes de escrever, e descobri que o painel da Roosevelt era antigo, de 2017. Tem uma matéria em um site de notícias dizendo que, depois de três meses de instalado, nenhum pombo foi visto na igreja.


Daí me lembrei que, em 2019, depois da construção do painel em SP, fui a Milão, na Itália. E na Piazza del Duomo, a praça da Catedral, havia milhares de pombos. Trabalhadores imigrantes ganhavam dinheiro no local tirando fotos dos turistas com os pombos. Era assim: os imigrantes colocavam farelos nos corpos dos visitantes humanos, enquanto os pombos pousavam em seus corpos. Em segundos, os pombos cobriam os turistas com suas penas e doenças.


Fiquei aliviado com a lembrança.


De certo modo, em 2019, os pombos já haviam inventado um jeito de hipnotizar os humanos. E, para humilhar, ainda saíam nas fotos.

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