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Nem tudo é o que parece


Outro dia me perguntaram se a escrita de um diário pode ser considera uma crônica. E eu disse que sim, desde que quem a escreva tenha consciência do que seja uma crônica e se utilize do formato "diário" para brincar mais com a crônica.

Escrever uma crônica com a estrutura de um texto de um diário é diferente de escrever um diário e dizer que é crônica. Nem todo texto corrido é uma crônica, muito menos um diário. Na maioria das vezes, o diário é só um relato do cotidiano. E a crônica não é isso, apesar de terem muitas definições de crônica na internet que digam que a crônica "é um relato do cotidiano".

Pelo contrário, quase nenhum texto corrido, em prosa, pode ser chamado de crônica. Não basta ser um relato do cotidiano. Precisa ser um pouco mais.

Mas, afinal, o que é a crônica? Sim, faz muito sentido que seja, a princípio, um recorte do cotidiano, uma história aparentemente banal que se destaca entre os acontecimentos rotineiros. Mas a crônica não é só isso, pois não basta simplesmente ter a história para que o texto seja considerado uma crônica, ou um bom texto. Depois da história, é preciso que o escritor(a) se preocupe e se dedique em escrevê-la de um jeito novo, surpreendente e interessante ao leitor.

Qualquer história pode virar uma crônica? A princípio, sim. Mas não é tão fácil quanto parece transformar qualquer história em uma crônica. É preciso ter um olhar aguçado para o cotidiano para enxergar a verdadeira história da história. É preciso encontrar o "tutano" do acontecimento antes de querer escrevê-lo. E, depois de enxergada a história, também é preciso ter um olhar apurado para as palavras do texto, para que elas juntas ajudem a transformar a história banal em uma história fantástica.

Quem escreve uma crônica deve sempre se perguntar: Por qual caminho devo seguir no texto? Com quais palavras devo conduzir a história? Com quais figuras de linguagem devo vou brincar para que o acontecimento ganhe um tom melhor ou um volume maior?

Essas são algumas das preocupações e tarefas do autor(a) de crônicas, para que o texto saia do lugar comum e ocupe o lugar da crônica. Por exemplo: a história da Máquina de Lavar que escrevi há algumas semanas, infelizmente, não aconteceu daquela forma que compus. É claro que eu floreei a história, pois é claro que brinquei com as palavras e escolhi por qual caminho a história devia seguir. O que aconteceu de fato foi que minha amiga se sentou na minha máquina de lavar, recém adquirida, e eu não gostei. Agora, falar sobre o meu romantismo dessa perspectiva foi uma escolha minha, de um olhar meu sobre o que a sociedade imagina que seja ser uma pessoa romântica. Houve um interesse meu em transformar esse acontecimento banal em uma história mais interessante, com mais graça.

É isso, para escrever uma crônica é preciso um pouco mais de graça, um pouco mais de descompromisso com a verdade e mais dedicação às palavras da história. O bom cronista é quem consegue retirar um acontecimento banal do cotidiano e transformá-lo, através do bom uso das frases, em um acontecimento fantástico.

Não é tão difícil quanto parece. Nem tão fácil também. É preciso que nos dediquemos mais e nos debrucemos com mais desejo sobre o texto para que a crônica aconteça. Nem tudo é o que parece. Nem todo texto em formato de crônica é realmente uma crônica. Por vezes, é só uma história. E tudo bem.

Mentira. Melhor se fosse uma crônica.


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