Ela nunca vai poder dançar de rosto colado com alguém numa pista de dança... Pensei nisso hoje cedo, depois de ler algumas matérias sobre a Inteligência Artificial, e senti um alívio.
Eu sei que agora algumas pessoas vão dizer que a Inteligência não só vai poder, como já está dançando. Sim. Eu já vi esses vídeos na internet, de robôs dançando. Mas não é desse tipo de dança que quero falar.
Apesar da timidez, eu gosto de dançar. Na minha juventude, fiz muitas terapias só para lidar com essa dificuldade que me atrapalhava a dançar. Eu adorava dançar, mas quando chegava nas festinhas eu travava. Tinha medo de me enturmar, de conversar com as garotas, de dançar na pista. Foi na psicóloga que comecei a enxergar como eram pequenos os riscos que eu corria numa pista de dança. E como eu perdia boas chances de beijar na boca quando eu não dançava.
Uma das primeiras memórias que tenho com a dança vem da adolescência, ao lado do meu irmão gêmeo. Foi com ele que comecei a ensaiar os primeiros passos na sala de casa. Depois passamos a praticar outros passos nas aulas de dança de salão que a mãe frequentava. Isso me ajudou a “soltar a pelves” e a dançar melhor nas festinhas, enquanto os garotos da nossa turma não dançavam.
Eu também já comecei um namoro em uma pista de dança. Foi quando um trio de forró começou a tocar numa boate pequena de uma cidade de Goiás, e nossos corpos se encaixaram no mesmo ritmo, “nós dois para lá e para cá” a noite toda. Alguns anos depois, também nos separamos quando nossos corpos pararam de dançar juntos.
Tempos depois, dancei sozinho na pista de dança que improvisei em casa quando a pandemia começou. E aqui eu poderia falar de outras danças, de histórias alegres-tristes que vivi naquele meu apartamento, mas essas são outros discos.
Fiquei em paz depois que me lembrei dessas memórias que nenhuma Inteligência Artificial vai ser capaz de lembrar, como as dos corpos se esbarrando numa pista de dança. E depois se esbarrando em outros e dançando novos passos.
É assim que seremos melhores: contando as histórias que só quem dança de rosto colado numa pista de dança pode contar.
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